domingo, 16 de julho de 2017

A Depressão vista por mim


Se fosse poeta, diria que depressão é fogo que arde sem se ver e nos consome o corpo, nos devora lentamente e lega-nos para um plano mais parecido com a morte do que com a vida. Mas como não sou nem poeta, muito menos de renome, resta-me exprimir aquilo que sinto quando sou assolada por uma enorme depressão que me deita por terra, me deixa completamente inoperacional, me sacode o corpo em vómitos compulsivos e não me permite tratar e cuidar da família.
É muito duro sofrer uma depressão, principalmente tratando-se de uma maleita que não se vê e que a sociedade constantemente desvaloriza. Ou me tomam por maluquinha ou me tomam por preguiçosa. Posso asseverar que não sou nem uma coisa nem outra.
Triste mesmo é saber que tudo o que faço, faço por objetivos que traço para mim própria, e que nestas alturas tudo deixa de fazer sentido, tudo é esquecido e todo o trabalho empreendido até então, se esvai num ápice.
Gosto, por exemplo de planificar as minhas semanas, elaborar os menus da família, estabelecer uma agenda, etc., mas nestas alturas o dia de amanhã é feito de improviso, à pressa e no desenrasca! E como odeio isso!
Ensombra-me o facto de já ter nascido assim, mais me ensombra estar sempre em contacto com o meu psiquiatra que recentemente me disse que o meu problema da bipolaridade está cada vez pior. Se até agora a minha vida apesar de feliz quando estou saudável, tem sido complicada, anteveêm-se dias mais sombrios.
Resta-me a consolação de ter um grande suporte familiar, uma Mãe sempre pronta a ajudar quando fico de cama por dias infindos e um Marido que tem uma paciência de Jó para os meus humores instáveis e que deita a mão quando a coisa está demasiado "preta"!
E, como dizem os brasileiros "Depressão não é frescura!", é uma doença grave, altamente incapacitante, não é preguiça é falta de força no corpo, não é capricho, é má disposição física, são dores no corpo, é sonolência, já para não falar de uma grande baixa autoestima e em casos extremos de uma enorme vontade de dar um tiro na cabeça!!

domingo, 9 de julho de 2017

Estou cansada


Nestas últimas semanas de vida da minha Vó Lu, dei tudo de mim. Todas as minhas forças foram sugadas culminando numa morte trágica que me deitou por terra, por ter sentido a impotência de não me ter mexido a tempo de lhe trazer dignidade aos seu últimos meses de vida. Mas não me posso culpar eternamente por algo que não fiz, por algo que não me passou pela cabeça que estivesse a ser feito.
Como não sou pessoa de me render às primeiras respostas que me surgem, sinto que começou uma luta amarga, difícil de ganhar. Mas uma  coisa é certa, culpada serei eu se não tentar repor alguma justiça nesta história e chamar à responsabilidade pessoas cujos atos foram negligentes já para não mencionar criminosos!
Como em tudo o que faço, envolvi-me bastante, até demais. Não sou daquelas pessoas capazes de me distanciar das coisas que faço. Isto é, naturalmente uma autocrítica. Já tenho tido muitos dissabores por ser assim. Já fiquei inúmeras vezes doente por me esgotar com todas as minhas energias numa causa. Quando caio no vazio ou quando as coisas me esgotam em demasia, caio doente numa cama.
A minha Mãe disse-me certo dia, e com razão, que eu não me sei distanciar dos problemas do dia-a-dia. A verdade é que sempre me considerei uma inadaptada para o mundo. Quando era mais jovem, incapaz de lidar com os problemas da vida, refugiava-me no álcool onde encontrei uma efémera felicidade, diverti-me fugazmente, intercalando tamanha felicidade com profundas depressões que me empurravam para a cama por dias infindos, de onde nem sequer saía para comer.
Nestas fases depressivas a vida deixava de fazer sentido, tendo por vezes tentado o suicídio sem sucesso, esperando simplesmente que a morte me levasse, sentido uma enorme desilusão ao acordar de misturas explosivas que fazia com álcool e medicação. Apenas uma vez, com muita pena minha na altura, fui salva pelo INEM.
A avaliar pelo que tenho sofrido com esta maldita doença, na altura roguei pragas a todos quantos me tentaram salvar a vida. Foram fases mais difíceis nume altura em que o diagnóstico estava a ser trabalhado e a medicação a tentar ser ajustada ao meu organismo.
Hoje, felizmente, confesso-me uma mulher feliz, com um casamento feliz, um Filho resplandecente de saúde e meiguinho, boas relações familiares e filiais, mas infelizmente doente.
Por muito que queira gritar ao mundo que a vida me corre de feição, que sou feliz, que moro onde quero morar, etc. e tal., não me posso confessar feliz com a maleita que tenho que me assola por terra, que me dilacera o corpo e me dá dores por todas as minhas entranhas, que me retira temporariamente a vontade de viver, que me põe a ver e a ouvir coisas que não existem e a questionar se vale a pena cá andar!
E é assim a vida ambígua de uma Bipolar que apesar de aceitar a doença, dava tudo para a não ter!

terça-feira, 4 de julho de 2017

Que feliz que eu sou!



Acabei de perder um ente numa morte trágica. Não conheci nada de novo, não foi nada que já não tivesse ocorrido na minha vida. Digo, por vezes em tom de brincadeira, que já trato a morte por tu.
Chorei ao ver a minha Mãe atirar as cinzas do meu Irmão ao mar. Chorei ao atirar as cinzas do meu Pai ao mar. E agora, sinto uma enorme responsabilidade com o fim a dar às cinzas da minha Avó. Mais uma vez, estou encarregue de fazer cumprir um último desejo. Ela adorava flores, árvores e afins. Ficará bem, mesclada com a natureza, numa cidade que ela amou com todas as suas forças.
Os encontros fortuitos que vou tendo com a morte, reavivam em mim memórias dolorosas, bem como despertam pensamentos metafísicos, nos quais equaciono milhares de coisas e acabo sempre por concluir acerca do quão frágeis são as nossas existências.
A verdade é que temo a morte com todas as minhas forças, não que ela bata à minha porta, mas que bata à porta de quem mais amo e me prive da sua companhia. Queria ter tido mais filhos, pois vivo ensombrada pela ideia de perder o meu. É algo que me transcende, que é irracional, mas que eu não consigo evitar.
Hoje, quando tive de deixar pela primeira vez o M. com pouca supervisão, tive um ataque de ansiedade como nunca tinha tido na vida. Toda eu tremia e estava encharcada em suores frios. Naquele momento considerei-me a pior mãe do mundo por tê-lo deixado ir. Vim para casa, deitei-me e chorei, tremi e suei, até que me deixei levar pelo  melhor antídoto que conheço, o sono.
Os contactos com a morte que vou tendo, avivam medos e acordam fantasmas em mim. Sou muito ansiosa, confesso, tenho medo, muito medo que a Morte desate a ceifar todas as vidas à minha volta e me deixe só. Há muito que digo que quero que ela me leve cedo, que não me deixe viver muitos anos. Só aspiro a deixar o meu menino criado e orientado. Se há uns anos, pouco me agarrava à vida, hoje, a semente que cá deixei ensinou-me a amá-la.
Conheço e compreendo a efemeridade da existência humana, já para não mencionar a sua fragilidade. É esta apreensão da vida que me leva a gostar tanto dela. A vida eterna deve ser aborrecida. A garantia da nossa vitalidade dificilmente nos daria motivação para fazer mais e melhor. É este sentir da sua efemeridade que me permite amar a vida com tanta intensidade. Se há uns anos brigava com as pessoas que me rodeavam, faziam beicinhos e chegava mesmo a amuar, qual criança mimada, tal se deveu, sem dúvida, à fraca consciência que tinha da minha própria fragilidade.
Se tenho um casamento feliz, boas relações familiares e sólidas amizades a esta consciência da vida o devo. Para mim nunca é demais pensar que, como tudo se esvai num ápice, o melhor é cultivar, regar e tratar tudo o que a vida nos oferece.
Tenho fraca saúde, mas isso não me demove de viver a vida. Quando olho para o M., resplandecente de saúde, a brincar na terra, a fazer construções de paus e pedras no seu mundo imaginário, só me cabe um dever: o de ser feliz!
Assim, e não querendo maçar por um discurso que não sendo, acaba por ter contornos meio mórbidos, tal a morbidez da minha cabeça ao momento, resta-me dizer que gosto da vida, que quando a doença não me bate à porta, amo-a com todas as minhas entranhas. E porque só assim sou capaz de amar Filho, Marido, restante família e amigos, não posso deixar de gritar ao mundo - Que feliz que eu sou!